Minhas opiniões e publicações, expostas neste espaço, são reflexões acadêmicas de um cidadão-eleitor, publicadas ao abrigo do direito constitucional da liberdade de expressão

"Por favor, leia devagar." (Ferreira Gullar)

07 fevereiro, 2006

Vaidoso como pavão

Poucas honrarias são tão significativas quanto àquelas que nos são conferidas pelos nossos alunos. Ser homenageado por uma turma de formandos, é o reconhecimento que mais marca um professor ao término de um curso.
Ser agraciado com uma placa e ter seu nome citado no rol dos homenageados é muito gratificante, mas ser o Patrono de uma turma de Direito é algo para nunca mais esquecermos. No 2º semestre de 2.005, orgulho-me de ser Patrono em duas turmas do Curso de Direito de minha Instituição.
Permito-me em homenagem aos formandos da 1ª turma do 2º semestre de 2.005, do Curso de Direito do UNIPLI, e por pura vaidade, postar o discurso que proferi na solenidade de colação de grau, ocorrida em 04/02.



Senhores presentes etc...

Prometo ser breve, neste momento de alegria, de festa e comemorações.

Inicialmente gostaria de agradecer a honra de ter sido escolhido pela turma Dr. Guilherme Nilo Chaves como Patrono, sei que a partir desse momento, minhas obrigações com vocês se multiplicam, passo a ficar registrado por toda vida na vida de cada um, e me torno responsável por assisti-los de hoje para sempre como verdadeiro guardião de seus ideais de justiça.

A distinção entre todos os professores que passaram e ficaram em seus corações, não me deixa melhor que Narciso diante de seu reflexo descoberto numa fonte d’água, estou vaidoso, vibrante e mais apaixonado por vocês. Obrigado.

Não sei bem se o momento é apropriado para dizer determinadas verdades, que lhes omiti durante todo o tempo que convivemos, mas tenho que fazê-lo, antes que seja tarde demais.

Preocupem-se meus amigos, vocês foram enganados, disseram-lhes que estavam se graduando em uma ciência normativa e dogmática. Acenaram à todos vocês com mais uma profissão de destaque social e repleta de glamour, lhes prometeram um trabalho e uma vaga no mercado. Mentira, foram enganados, não lhes disseram a verdade real, durante todo tempo que passaram no Curso, vocês estavam na verdade em uma academia militar, estavam sendo treinados para guerra, se forjaram soldados e a partir de agora partirão para o campo de batalhas.

Meus amigos, meus afilhados, vocês têm um novo compromisso, o de defender e guardar a Constituição, as Leis e a Justiça.

Graduaram-se diferentemente de outros que graduam-se no terceiro grau, são depositários do Estado Democrático de Direito, são colunas de sustentação da nossa sociedade.

Conheço cada um de vocês pelo nome, sobrenome, pensamentos e idéias. Atrevo-me a fazer parte de seus sonhos, orgulho-me de ter contribuído na formação individual e no inconsciente coletivo que abita o espírito da turma. Sei do potencial coletivo e individual que hoje colocamos a disposição da sociedade. São homens e mulheres de qualidade profissional inquestionável. Parabéns a vocês.

Nesse momento peço a todos como última lição, esqueçam o que sempre lhes ensinei propositadamente: “coloquem a justiça para fora de sala, primeiro vamos aprender o Direito”.

Melhor, tenham o Direito como suas armas para conquistar a Justiça. Partam para a luta e vençam por ela.

Neste novo milênio, recém iniciado, evidencia-se lamentável paradoxo da trajetória humana ao longo da história. Se por um lado, atingiu-se nível de progresso tecnológico e científico jamais visto anteriormente, por outro, assiste-se à exclusão de milhões de seres humanos do processo de evolução social, convertidos em “escravos do mercado”. Tem-se um mundo rico em progresso para alguns e miserável para “milhões. “A vida é bela” para poucos e trágica para os demais. Em síntese, vê-se uma sociedade humana com imensa dose de injustiça social.

As transformações sociais ocorridas a partir do início do último século, surgidas na Europa e difundidas para o mundo, sem dúvida representaram avanços nunca antes vistos, porém bem aquém das transformações necessárias que urgiam àquela época. Foram elaboradas novas leis que se propunham amparar os mais combalidos na sociedade, novas Constituições surgiram e em seus conteúdos, onde antes somente se lia da organização do Poder e seu exercício, com algumas considerações sobre os direitos civis, para alguns poucos, passaram os novos textos a contemplar alterações na ordem econômica e social. A sociedade sabia que precisava se transformar e se tornar mais justa, entretanto, os senhores do Poder não permitiram que esses avanços fossem de tal monta que evitassem nossa herança contemporânea.

Também, nas lições de Roberto Lyra Filho aprendemos que “a lei sempre emana do Estado e permanece, em última análise, ligada à classe dominante, pois o Estado, como sistema de órgãos que regem à classe dominante, pois o Estado, como sistema de órgãos que regem a sociedade politicamente organizada, fica sob o controle daqueles que comandam o processo econômico, na qualidade de proprietários dos meios de produção”.

Assim, se no século passado as intervenções constituintes e legislativas não transformaram a sociedade, a ponto de efetivamente combater a miséria e as desigualdades, hoje também não podemos ambicionar transformações significativas somente através da atividade legiferante.

Símbolo da modernidade, a propalada “globalização” não é nada mais nada menos que um retrocesso político-social, oculto pela máscara do liberalismo e da economia de mercado. Ao contrário de poucos malintencionados, não acreditamos no fim da história.

O mundo não mudou, as relações de poder não mudaram, o Poder pela história sempre esteve e ainda está concentrado nas mãos dos mais ricos e dos mais fortes, o Poder ilegítimo e abusivo é nosso principal inimigo nessa guerra pela justiça.

Vocês meus amigos, também não se formaram para ser legitimadores do Poder que avilta, não se prepararam nos últimos anos para enfeitar gabinetes ou tribunas, vocês meus amigos, muito pelo contrário, se prepararam para lutar pela dignidade do ser humano, pela soberania de seu país, pela cidadania de seus habitantes, pelos valores sociais do trabalho, pela democracia e pela igualdade das pessoas. Seus ideais de Poder são outros, o Poder para os justos é transformador.

Seus compromissos são com uma sociedade livre, justa, solidária, desenvolvimentista, sem preconceitos ou discriminações, que busque erradicar a miséria e a diminuição das desigualdades sociais. Não são minhas essas palavras e vocês já as reconheceram, pertencem aos ideais contidos nos dois primeiros artigos de nossa Constituição Federal.

Esse é o campo de batalhas que vocês encontrarão a partir de hoje, cabe a cada um optar por qual lado e uniforme que usarão. Não tenho dúvidas por conhecer a todos que ficarão ao lado da justiça.

Como afirmei inicialmente, a partir desse momento minhas obrigações se multiplicaram com vocês, mas a recíproca também se torna verdadeira e ficarei em permanente vigília sobre cada um. Terei sempre as portas abertas para meus afilhados, onde encontrarão refúgio, guarita e suprimentos quando estiverem na luta pelo bem, mas serei implacável com qualquer um que fraquejar em seus princípios.

Aproveito ainda a oportunidade para dizer aos novos bacharéis, que o Direito não é para os fracos, o Direito também não é para os que se valem da força, o Direito é para os sábios que buscam o justo.

No Antigo Testamento, no Segundo Livro de Crônicas, Capítulo 1: do verso 7º em diante, recompensado por Deus, Salomão que durante toda sua vida tinha atendido e obedecido ao Grande Arquiteto do Universo, indagado sobre qual riqueza desejaria possuir, qual bem, honraria ou mesmo a própria morte de seus inimigos, Salomão pediu ao Pai, sabedoria para ser justo com seu povo.

Busquem a sabedoria e alcançaram a justiça, tal como o fez Salomão; sábios e justos, encontrarão o verdadeiro caminho para suas realizações. Busquem somente o ouro e a prata, e encontrarão uma vida vazia e sem propósitos.

Meus amigos, prometi ser breve e assim serei, desejo a todos uma vida de lutas, de boas lutas, coroadas por grandes vitórias. Tenho certeza que com os conhecimentos adquiridos e com o espírito da justiça que anima a cada um, encontrarão a felicidade.

Saúdo a todos meus afilhados e que Deus os acompanhe.

Obrigado.

7 comentários:

Elaine disse...

Se eu que sou apenas sua colega blogueira fiquei emocionada, imagina seus alunos.
Parabéns as turmas que o escolheram como Patrono.
Tenho certeza que eles poderão contar sempre com sua inteligência e com suas asas calorosas de padrinho.
Sucesso as duas turmas e que Deus ilumine esse Patrono tão querido para que ele possa continuar levando suas palavras as novas turmas que virão.
Sds...Elaine Paiva

Ricardo Rayol disse...

Só espero que vc nao tenha levado uma facada no bolso rs Parabens pela homenagem

Alice disse...

Emocionante :) , deve ser uma satisfação, assim como o artista na criação de sua obra .
Parabéns prá vc e parabéns para eles .
Legal que vc voltou :)
Bom dia, bjins

Anônimo disse...

Ozéas, boa tarde.
Ontem li o seu discurso e me emocionei. Não consegui falar.
Hoje voltei, reli e novamente me emocionei, primeiro por sua humildade, característica que só aqueles que muito sabem cultivam.
Em segundo lugar por você lembrar aos seus afilhados as palavras de Salomão, em uma época marcada pelo individualismo e o egoísmo.
Parabéns Mestre, pela homenagem que recebeu, mais que merecida e principalmente pela lição, a última que transmitiu a eles e nós, seus leitores e fãs.

Beijo

Anônimo disse...

Palavras do mestre Ozéas!"
"os conhecimentos adquiridos e com o espírito da justiça que anima a cada um, encontrarão a felicidade."
Maravilhoso, e resume bem seu texto. Bjs :-)

Elaine disse...

rsrsr...awanhene.
bjs

Anônimo disse...

tenho um amigo engenheiro que foi patrono também de duas turmas o ano passado, e estávamos conversando sobre isso, ele me contando, de repente ele se emocionou e me disse:

Cláu, esse sim é op segredo do sucesso para um professor.
Além de ensinar, chamar para a luta, e até bater ( figurativamente claro) ainda eles fazem isso pela gente.
Nos dão razões para continuar.

Parabéns...
um beijo no coração