Minhas opiniões e publicações, expostas neste espaço, são reflexões acadêmicas de um cidadão-eleitor, publicadas ao abrigo do direito constitucional da liberdade de expressão

"Por favor, leia devagar." (Ferreira Gullar)

27 novembro, 2010

Somos o que somos

Somos publicamente pela paz, mas não deixamos de torcer pelo confronto, mais ou menos como naquela tese de que as pessoas assistem corridas de automóveis ou motocicletas, torcendo por um acidentezinho, só pra dar um pouco mais de emoção.

Somos publicamente pela vida, não queremos nenhum morto ou ferido, mas sabemos como é importante quebrar alguns dos ovos para fazer as omeletes, ainda mais quando esses não são das nossas caixas, mas que se dane a vida alheia, o que importa é a nossa afinal.

Somos publicamente pelas garantias democráticas, das liberdades, do devido processo legal, entretanto, só aceitamos transigir a isso quando o direito em jogo não é o nosso, particular e individual, quando o direito atingido é o “dele”, que aqui pra nós, faço questão de desconhecer.

Somos publicamente contra a guerra no Golfo, no Iraque, na Palestina, na Coréia, acreditamos que a razão e a inteligência humana é maior que o confronto e sempre há outra saída, que não seja a custo de vidas, mas não abrimos mão de nossa guerra doméstica, afinal, a nossa sem dúvida nenhuma tem razão de ser.

Somos publicamente preocupados com as questões sociais e entendemos que alguma coisa urgente tem que ser feita, porém, nossa melhor sugestão no momento é a deflagração total do processo, a aniquilação geral, quem sabe mesmo com o emprego de napalm.

Somos publicamente hipócritas, porque privadamente somos exatamente assim.

30 outubro, 2010

Convite

Dia 10 de novembro o autor do Blog estará na Ordem dos Advogados de Niterói proferindo palestras aos alunos de Direito e filiados daquela entidade.

Escolhido pela Comissão de Ensino Jurídico da OAB de Niterói, o tema será: INQUÉRITO POLICIAL. Procedimento inquisitivo ou acusatório pela nova Constituição? Se acusatório, admite ou não o contraditório?

O horário marcado para abertura dos trabalhos está previsto para 17:45, com previsão de encerramento às 21h

A OAB de Niterói,fica na Av. Ernani do Amaral Peixoto, nº 507 - 11 andar.

29 outubro, 2010

Renato Gaúcho, o eterno falastrão

Tá bom, devemos um campeonato sobre nosso arqui-rival no Rio de Janeiro por uma barrigada (sem trocadilho, por favor) do seu Portaluppi, bem como, na condição de técnico uma Copa Brasil; também vamos ser justos, aquela Libertadores perdidas nos pênaltis, fica registrada como uma das maiores injustiças (se existe no futebol) que já vimos acontecer, mas daí pra frente, como técnico Renato foi uma tragédia, não só no Fluminense, mas por outros times ai a fora.

O rebaixamento na vida de Renato, o fanfarrão, se tornou aquela nuvenzinha de desenho animado, que acompanha o personagem azarado para onde quer que vá.

Agora no Grêmio, depois de amargar as sandálias da humildade como técnico desempregado e de segunda divisão, de verdade, acertou o time gaúcho, cumprindo só agora o que prometeu no passado, lá no Fluminense, “vamos passear no brasileirao”.

O Grêmio hoje muito parece Flamengo de 2009, destruído e destroçado, semi-rebaixado no primeiro turno, que embalou e faz a melhor campanha do segundo, esse meteoro com cauda de minuano, até que vinha bem, calando com resultados as bocas coloradas (cada um tem o Lex Luthor que merece), provando que se jornalista entendesse tanto assim de futebol, todos estariam ricos com a Loteria Esportiva.

Acontece que ontem, o que seu Renato Portaluppi não esperava, ou não lembrava é que enfrentaria um clube de futebol de verdade, uma tradição em superações, um clube que conhece o céu (campeão mundial de 52) e o inferno (terceira divisão em 99), um clube que tem times onde se forjam guerreiros e uma torcida que está se impondo por sua condição e responsabilidade, convencida que é ela a principal responsável por qualquer vitória ou título.

Renato Gaúcho ontem foi surpreendido, esperava jogar contra um time desfalcado e desfigurado, onde seu artilheiro e único atacante em condição de jogo, não marca um gol a uma dezena de jogos, pior, quando o faz é contra sua própria meta.

Renato esqueceu que o Fluminense joga esse campeonato com 13 jogadores, os 11 inscritos regularmente, a torcida e o Conca, que vale por dois craques de qualquer time.

Renato falastrão, cometido em suas palavras esse ano, veio ao Rio e Janeiro para voltar o Sul com as palavras de falsa humildades prontas a serem ditas na entrevista coletiva após o jogo, imagino como seria: “O Grêmio vem conseguindo se superar e agora podemos sonhar com o título, por que não?”. Não queimou sua língua porque o Fluminense não deixou, mas queimou seus pensamentos e o resultado foi a desdenha e parlapatice própria dos arrogantes derrotados, “ser campeão assim é mole” (http://bit.ly/amMkgm).

Ser campeão contra a vontade de uma CBF, que quer por que quer o Corinthians com o título, não é mole não Renato, ainda mais depois da humilhação que seu não menos arrogante Presidente Ricardo Teixeira passou, ao anunciar o que não tinha para entregar, o Muricy Ramalho na sua seleção; Ser campeão com um time que aprende a jogar a cada partida, porque não consegue formas cabeça, tronco e membros (defesa, meio e ataque) iguais em seqüência mínima de dois jogos, não é mole não Renato; Ser campeão quando não se joga mais uma partida como mandante depois do arbitrário fechamento do Maracanã, não é mole não Renato.

Pois é ontem o Fluminense mais uma vez superou todas as expectativas e calou as vozes agourentas e invejosas, fez mais, devolveu para o Sul o Renato Falastrão, com a cabeça inchada e uma puta dor e cotovelo.

26 outubro, 2010

Concentração do poder

Quem vota na Dilma te lá suas razões, deve-se aceitar e respeitar esse voto e a recíproca, pelo menos, deveria ser verdadeira para quem escolhe a oposição, afinal a democracia moderna sustenta-se sobre os pilares da tolerância e diversidade.

Entretanto, não pode passar sem registro a ameaça real que representa à democracia a eleição da candidata governista, considerando o aspecto referente a concentração do poder político em uma só direção, ou seja, “nunca antes na história desse país” republicano, existiu a possibilidade de tanto poder concentrado em uma só direção, sob o manto de uma legalidade/legitimidade questionável.

Observando-se os números do recém-eleito Congresso Nacional, pode-se constatar um significativo aumento da base governista.

Segundo informa a impressa, recepcionados os números sem outros questionamentos, até porque qualquer oscilação não significaria profundas alterações na tese desenvolvida, 470 dos 513 deputados federais e 57 dos 81 senadores que comporão o próximo parlamento, estariam alinhados ao atual governo.

Conforme preceitua o texto constitucional no seu artigo 60, § , quanto à tramitação e aprovação de uma Emenda Constitucional, “A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros.”

Assim, observados os congressistas eleitos, em ambas as Casas (Câmara e Senado) o atual governo e, na hipótese, a sua sucessora teria confortável maioria qualificada de 3/5 alcançada, para a aprovação de qualquer projeto de alteração da Carta Constituinte.

Poder-se-ia retrucar, ao argumento que alguns temas estariam “blindados” pelo princípio das cláusulas pétreas previstas no mesmo artigo em parágrafo subseqüente[1], ou seja, conforme a própria Constituição de 1988, algumas questões estariam imunes a tentativa de alteração através de Emendas, visando à garantia e estabilidade da sociedade democrática.

Em réplica, conforme o artigo 102 da Constituição, qualquer ação direta ou declaratória de constitucionalidade, bem como, em última instância, o questionamento da inconstitucionalidade de uma Lei ou Emenda num caso concreto, através de Recurso Extraordinário, será sempre julgado pelo Supremo Tribunal Federal, ou seja, a última palavra sobre qualquer modificação no texto constitucional recai sobre 11 Ministros do STF.

Portanto, é lícito ponderar que embora não seja a princípio o caso, entretanto, em tese, o atual órgão encarregado de julgamento das questões constitucionais, STF, não seria o paradigma de segurança numa análise isenta e descompromissada, frente a qualquer alteração violadora da Carta Magna, considerando que o próximo governo, eleito em 31 de outubro, terá como herança do atual 9 de 11 Ministros do Supremo, indicados nos dois últimos mandatos pelo atual presidente.

Considerando-se, ainda que por hipótese, que a candidatura da Dilma representa mais que um projeto de governo, mas verdadeiramente um projeto de poder, os referenciais de qualquer argumentação mudam e, não se poderia descartar a possibilidade de que a própria Corte Constitucional do país, já há algum tempo venha sendo constituída para os fins agora evidenciados.

Finalizando, são valida duas reflexões produzidas por Giorgio Agamben em sua obra “Estado de Exceção”:

"Isso significa que o princípio democrático da divisão dos poderes hoje está caduco e que o poder executivo absorveu de fato, ao menos em parte, o poder legislativo. O Parlamento não é mais o órgão soberano a quem compete o poder exclusivo de obrigar os cidadãos pela lei: ele se limita a ratificar os decretos emanados do poder executivo. Em sentido técnico, a República não é mais parlamentar e, sim, governamental."

"Uma das características essenciais do estado de exceção - abolição provisória da distinção entre poder legislativo, executivo e judiciário - mostra, aqui, sua tendência a transformar-se em prática duradoura de governo."



[1] § 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

I - a forma federativa de Estado;

II - o voto direto, secreto, universal e periódico;

III - a separação dos Poderes;

IV - os direitos e garantias individuais.

11 outubro, 2010

Declaração de voto

Ontem assisti ao debate na Band entre o Serra e a Dilma, confesso, acho que o país merecia muito mais que chegar a uma final plebiscitária, entre uma proposta neoliberal refundada e outra conservadora de esquerda.

Juro, olho para Dilma e vejo o próprio Chávez, com todas as suas teimosias e certezas que todos estão errados, menos ele é claro; também tenho no Serra a lembrança de personagens e práticas que possibilitaram que essa tropa de salteadores, mensaleiros e marqueteiros chegasse ao poder, FHC tem lá sua responsabilidade omissiva.

A discussão ideológica há muito deixou de existir, Dilma não pode “xingar” o Serra de neoliberal afinal, ela e seu ventríloquo custearam às expensas públicas o enriquecimento dos bancos e do capital parasitário internacional pelos últimos oito anos, numa fúria que deixaria qualquer Chicago Boy orgulhoso, ainda mais se soubesse que o palanque eleitoral foi construído com um discurso socialista.

Por outro lado, o Serra não assume defenestrar as promessas ou práticas da Dilma e seu ParTido, ontem mesmo no debate afirmou da necessidade estatizante dos Correios, CEF, Banco do Brasil, Petrobras, etc, etc, etc.; garantiu a continuidade das políticas públicas assistencialistas e sabe lá, sua própria expansão eleitoreira, no final, ficou parecendo tudo farinha do mesmo saco, ou como bem vociferou o candidato de Plínio de Arruda no primeiro turno, “Dilma, Serra, vocês são todos iguais”.

Concordo em parte com o vovô candidato (carinhosamente, por favor), quando em verdade repetiu com outras palavras a célebre frase “o rei está nu”.

A parte do Plínio que aceito como verdadeira é a que se refere a igualdade de propostas para soluções dos problemas, Dilma e Serra se oferecem como gestores, ou equipados com as melhores equipes para a gestão nacional, como se nossos problemas econômicos, educacionais, habitacionais, de segurança, de saúde, de emprego etc, estivesse apenas esperando pela contratação de um encarregado, com equipe própria para administra uma empresa.

Sob a ótica apresentada, portanto, nossa eleição está mais para a contratação de um novo zelador, que deve ter como qualidades, ser honesto, dedicado, austero, simpático e preferencialmente, dormir no prédio.

O que acho que o Plínio não viu, ou não quis dizer, está ligado a questão do projeto de poder, é ai que “a porca torce o rabo”. Na definição de quem pretende “o que” e “por quanto tempo”, pode estar o limite exato entre a possibilidade de alternância de poder e a conseqüente manutenção da democracia no país.

O ParTido da Dilma não parece ser muito confiável nesse ponto, as ameaças se tornam permanentes e cada vez mais comuns quando a questão envolve as liberdades individuais, quando por exemplo o governo acusa e busca regulamentar controle sob a imprensa que não faz a propaganda “chapa branca”; quando interfere diretamente usando de sua “tropa de choque” (Renan, Collor, Salgado) na defesa de seu protegido Senador Sarney; quando invadem sigilos bancários e fiscais, prática a propósito bastante comum nos dois mandados do Luis, etc, etc, etc.

Aqui a pontuação decisiva vai para o Serra, que pertence a um partido que mesmo depois de oito anos acostumados ao Palácio do Planalto, realizou uma transparente e colaboradora transição, a propósito, jamais realizada com tanta dignidade no país, como também, não houve registros durante o mesmo período, de qualquer intenção ou ameaça às instituições democráticas por parte do poder estabelecido.

A questão passa então pelas práticas no exercício do poder. Já tive oportunidade em outra ocasião quando escrevi, aos meus dois únicos e fieis leitores, de afirmar que a grande diferença entre o Serra e a Dilma está no fato, de caso o governo do primeiro não seja aprovado, em quatro anos se poderá escolher a segunda como opção, entretanto, caso não se aprove um eventual governo da Dilma, sempre ficará a dúvida se existirá essa mesma oportunidade de alternância.

O Serra não é meu candidato Ideal, não me representa integralmente, tão pouco acredito que possa realizar 50% de suas promessas, mas na conjuntura é o que tenho de mais capacitado é o melhor, sob todos os ângulos, especialmente o das liberdades democráticas.

As dúvidas que existiam em momentos iniciais, já foram afastadas, sei que tenho que “dar um passo atrás para conseguir dar dois em frente”, ou como uma vez entendi com o então líder Hércules Correia, durante a campanha derrotada de Miro Teixeira ao Governo do Estado (1982).

O problema residia na formação de uma frente popular pela redemocratização do país, em confronto de consciência com o populismo chaguista carioca, quando bradou então Hércules justificando o apoio ao Miro: “tem que enfiar a mão na merda, embaixo tem água limpa”.

09 outubro, 2010

Blog em campanha

Depois vão dizer que quem puxou a campanha pra baixo foi a oposição



Mas com um coordenador desse do meu lado, não preciso de mais nenhum inimigo

07 outubro, 2010

Mario Vargas Llosa

Li com muita satisfação que o escritor Mario Vargas Llosa é o ganhador do Nobel de literatura 2010, engrandecendo a galeria de escritores que foram homenageados com o título, figurando agora ao lado de nomes como Jean-Paul Sartre, Pablo Neruda, Gabriel Garcia Marques, José Saramargo e Günter Grass, só para citar os mais conhecidos

O autor, com 74 anos é escritor, jornalista, ensaísta e político no Péru, onde inclusive, concorreu à presidência da República em 1990, quando foi derrotado por Alberto Fujimori.

Do autor vencedor de 2010, tive a oportunidade de ler “Batismo de fogo”, “Conversa na Catedral”, “Pantaleón e as visitadoras” e “A guerra do fim do mundo”, confesso, cada um melhor que o outro nas suas propostas, que tramitam dos sentimentos cinza de uma escola militar, passando pelo cotidiano e político peruano, singrando pelo Rio Amazonas em estória de magnífico humor, onde um rigoroso capitão gerencia um grupo especial de prostitutas para as tropas de fronteiras até, quem sabe, a melhor narrativa da Guerra de Canudos já escrita, revelando-se Llosa brilhante brasilianista.

De Mario Vargas Llosa também guardo uma das melhores frases que já ouvi e acredito: Só um idiota pode ser totalmente feliz

01 outubro, 2010

Huelga general

José Luis Rodríguez Zapatero, oriundo do Partido dos Trabalhadores Socialistas Espanhol (PSOE), do qual inclusive já foi secretário geral, em 17 de abril de 2004, foi reconhecido pelo Rei Juan Carlo presidente do governo da Espanha, cargo equivalente a Primeiro Ministro em outros países.

Seu partido que constituiu maioria nas eleições legislativas espanhola de 2004, configurou seu governo sem coligações, considerando os 42,5% dos votos obtidos, ou 164 cadeiras no parlamento, contra 37,64% do Partido Popular, equivalente a 148 cadeiras.

Eleito através de uma plataforma socialista, Zapateiro sentiu na pele a fúria dos trabalhadores no último dia 29, quando foi deflagrada uma greve geral, primeira em oito anos, pelas principais centrais sindicais espanholas, que afirmam mais de 10 milhões de trabalhadores parados, além de repercussão internacional com protestos por outras capitais da Europa. Leia mais aqui

Motivo da greve, os socialistas europeus não são mais os mesmos, agora por lá, ao que parece, na interpretação neo-socialista, quem salvará a economia e a própria União Européia é o clássico capitalismo, ou “a mão invisível do mercado”.

“MADRI — O governo socialista espanhol apresentou nesta quinta-feira ao Parlamento o seu orçamento para 2011, marcado pela austeridade, após uma semana em que enfrentou uma greve geral e a degradação da nota de sua dívida pela agência Moody's”. Leia mais aqui

Creio valer a leitura do manifesto expedido pelo comando de greve, que mobilizou 70% dos trabalhadores daquele país, qualquer semelhança não será mera coincidência com algumas coisas que conhecemos por aqui.

Manifiesto Huelga general 29 de septiembre 2010

Las confederaciones sindicales de Comisiones Obreras y de la Unión General de Trabajadores hemos adoptado la decisión de iniciar un proceso de movilizaciones, que culminará con la celebración de una Huelga General el próximo 29 de septiembre, para expresar el contundente rechazo de los trabajadores y trabajadoras de este país a las políticas de recortes sociales y supresión de derechos de los trabajadores decretadas por el Gobierno, bajo amparo y excusa de directrices europeas.Lei na integra o manifesto

Está com problemas no espanhol, não se faça de rogado, use o translate do google copie e cole e traduza o texto.

Agora eu entendi...

29 setembro, 2010

O difícil voto majoritário

Tenho ouvido muita gente boa dizendo que está sem opção para votar, é verdade, as candidaturas majoritárias postas para ganhar e perder, com honradas exceções ideológicas, basicamente reproduzem o mesmo discurso, afinal, qual a diferença das palavras da Dilma para o Serra, e Marina então, onde está a marcante diferença esperada?

No âmbito estadual, Cabral corre solto pela raia de dentro, afinal, os “nanicos” radicalizaram no discurso, mas não conseguiram convencer e reverter uma tendência de dominação, moldada inteligentemente já há bastante tempo, além do que a prévia indicação midiática dos escolhidos à competição de fato, destruiu qualquer tentativa de conscientização política que se pretenda.

A propósito, pode até não parecer, mas para muitos partidos que estão no pleito o mais importante é a divulgação de suas idéias e propostas que qualquer expectativa de vitória, portanto, quando se alija do debate político partido ou candidato, se diminui a amplitude da proposta democrática, o que não por coincidência, favorece ao status quo.

Ao Senado dois votos, ai fica um pouco, só um pouco, mais fácil a escolha, dá para votar com alguma identidade mais assumida, o discurso tem que fugir das questões domésticas e os candidatos, ainda que não queiram, se oferecem mais ideológicos, embora as máquinas estadual e federal esteja queimando “combustível aditivado”, de um lado o “lindinho” é o menino “dela”, no outro lado da aliança o “coroa” é o apoiado pelo garotão, correndo por fora, vivendo do passado e querendo valer o ditado “a Cesar o que é de Cesar”, um provável azarão.

Quanto ao voto proporcional, Deputados Federais e Estaduais, cada vez mais o eleitor aplica o voto regional, a representação se municipaliza eleição após eleição, os candidatos se oferecem às suas bases centralizadas em cidades específicas, ou se valem de práticas “coronelistas”, garimpando votos com prefeitos afilhados e aliados pelo interior. O voto distrital, puro ou misto bem poderia facilitar ou legitimar o que o eleitor já vem realizando na prática, mas a pauta da reforma eleitoral não comporta discussão tão ameaçadora.

As propostas dos candidatos ao executivo (estadual e federal) são estranhamente coincidentes, acompanhe-se apológicas manifestações de continuidade e manutenção de certas políticas públicas, das Unidades de Polícia Pacificadoras - UPP, Lei Seca, novos ou aparelhamentos de Unidades de Pronto Atendimento - UPAs, de escolas e tantas outras do gênero, para cada vez mais se ficar convencido que o discurso é o da gestão, ou melhor, da falta de gestão.

Assim, a questão da governabilidade é posta em plano principal, a tecnologia de governo é que dará realização e plenitude aos ideais de segurança, justiça, oportunidades e tudo mais, o que está errado não é a sociedade, suas desigualdades agudas, suas lutas de classes, o que falta é gestão e obviamente, todos se oferecem igualmente competentes.

Para nossos futuros governantes, por exemplo, a violência está associada à ausência de Estado, prosseguindo ao final desse raciocínio, quanto mais Estado presente (polícia) mais segurança, menos violência; não precisa se pensar muito para concluir que essa proposta desembocará, não muito longe, num Estado policial, autoritário e truculento.

Aplicando o mesmo raciocínio, quanto menos álcool, menos mortes, quanto mais empresas, mais trabalho, quanto mais escolas mais empregados e assim por diante. Os indivíduos, as causas, a organização social, as relações, o modelo político e econômico não influem nos resultados, ou seja, não há fatores, o mundo da vida não existe, o que há são "coisas" a serem geridas; todos os discursos no final se confundem e justificam a confusão dos eleitores.

Não há relações entre os seres humanos e as coisas, o que há são relações entre homens e homens (sentido lato). As "coisas" foram feitas para ser possuídas, dominadas e alteradas conforme a vontade do ser humano, “coisificar” as pessoas como técnica, acreditando que as questões políticas passem por mera gestão dessas é transformá-las em objetos, onde os candidatos se oferecem e se preparam à futuros proprietários de seus eleitores.

24 setembro, 2010

Os apaches estão certos

Não gosto do Gilmar Ferreira Mendes, ainda me sobram muitas dúvidas levantadas à época do Caso Daniel Dantas-Opportunity, mas admiro o Ministro pela sua precisão técnica e suas qualidades acadêmicas, a propósito, tenho seu livro “Curso de Direito Constitucional”, que utilizo na elaboração de minhas aulas.

Não gosto do Marco Aurélio Mello, sua nomeação poderia ser até justa, mas para mim contaminou-se pela origem, o Ministro é primo e foi indicado à época ao STF pelo então Presidente Fernando Collor de Mello, entretanto, suas posições únicas muitas vezes bastante coerentes, me fazem também admira-lo na judicatura suprema.

Não gosto do José Antonio Dias Toffoli, sua nomeação ainda não me desceu goela abaixo, o simples fato de ter sido advogado pessoal do Presidente da República e do PT não lhe credencia para a mais alta corte, além do que, a exigência constitucional de “reputação ilibada” ficou bastante arranhada pela condenação junto a justiça do Amapá sob a acusação de ter participado de licitação ilegal.

Portanto, se tivesse que classificá-los num filme de faroeste, certamente fariam parte de uma tribo incendiária de ranchos e colecionadora de escalpos de mocinhas indefesas, entretanto, longe de me arrogar o cowboy do enredo, encarregado de promover a justiça em terra de ninguém, tenho que admitir,os homens maus dessa vez estão certos.

No caso do julgamento da propalada “Lei da Ficha Limpa”, apesar do gosto ruim que fica na boca, tenho que afirmar que os três “apaches” fizeram uma interpretação coerente e votaram, preservando a autonomia dos Poderes da República e própria democracia.

Ser impopular é muito difícil em época de dominação midiática, entretanto, ter a consciência tranqüila que não se pode apoiar a retroatividade das leis é muito mais digno e louvável.

Preceitua o art. 16 da Constituição Federal: “A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência” (grifo nosso).

Em simplória interpretação gramatical, o exegeta deve-se curvar ao comando, ou seja, não se aplica nova lei eleitoral sem que seja respeitado o princípio da temporariedade, ou seja, um ano da data de sua vigência.

A propósito do artigo 16, em interpretação extensiva, este é de tão grande importância às instituições democráticas, que não pode ser suprimido do texto constitucional, constituindo-se “clausula pétrea”, ou seja, conforme o art. 60, § 4º, inciso IV, “Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: os direitos e garantias individuais”, que estão abrangidos pelo manto dos direitos fundamentais (art. 5º ao 17 da CR/88).

Por maiores que sejam os propósitos, bem diz o ditado que “o inferno está cheio e boas intenções”, violar o princípio contido no artigo transcrito é muito mais do que aparenta, se flexibilizaria um comando constitucional garantidor do próprio estado democrático de direito.

Explico, imaginemos que hoje, determinado candidato à Presidência da República, liderando a corrida eleitoral com significativa margem indicativa de vitória, tendo maioria absoluta no Congresso Nacional, resolvesse alterar a lei dizendo que: “O candidato a Presidência da República, eleito no pleito deste ano, terá um mandato de 15 anos”.

No exemplo firmado, teríamos a mesma violação ao princípio da temporariedade, ou anuidade às leis eleitorais, ou seja, o que hoje nos parece bom, justo e verdadeiro, poderá se tornar precedente a outros julgamentos pelo mesmo STF justificando a derrocada da democracia.

A verdade é que se o Congresso desejasse tanto a aprovação desse instrumento repressor, deveria ter aprovado a regra antes de outubro de 2009, ou seja, o Congresso inventa e o Judiciário é quem tem que aparar as arestas, entretanto, não cabe Judiciário tomar decisões populares, mas julgar conforme a lei e seus princípios.

Nas palavras do Ministro Marco Aurélio Mello: "A primeira condição da segurança jurídica é a irretroatividade em si da lei. O que tivemos com essa lei que se diz de origem popular – e enquanto não houver uma revolução o povo também se submete à lei – com a lei complementar Lei da Ficha Limpa? Que culpa temos nós de o Congresso Nacional ter editado a lei 135 Lei da Ficha Limpa quando já se avizinhavam as eleições?"

No mesmo tom, Gilmar Ferreira Mendes ao proferir o sexto voto iniciou seu discurso afirmando, que o fato de a Lei da Ficha Limpa ser de iniciativa popular não a tornava inquestionável: “Muitas vezes tem de se contrariar aquilo que a opinião pública entende como salvação, muitas vezes para salvar a própria opinião pública”. “Se a iniciativa popular tornar inútil a nossa atividade, melhor fechar esse tribunal”.

Esse é o espírito da coisa, dói, fede, revolta, mas não podemos deixar a flexibilização e a opinião pública midiatizada, derrubar as colunas principais de sustentação de todo o sistema jurídico. A lei não pode retroagir, os princípios não podem ser violados, o casuísmo e o utilitarismo não pode ser referência para as decisões do Judiciário.

A propósito dos princípios constitucionais, um deles afirma que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” (art. 5º, LVII da CR/88), sob a égide desse princípio, foi dada a vitaliciedade ao Ministro José Antonio Dias Toffoli, quando da sua sabatina pelo Senado Federal.

23 setembro, 2010

O Brasil não é do PT!

Minha modesta contribuição no final da campanha.



Para enviar é só copiar o endereço: http://www.youtube.com/watch?v=FJ7kFXeII44

22 setembro, 2010

Aristóteles e a felicidade

Meu amigo Gilvan[1] ensina que conforme conceitos aristotélicos teríamos alguns propósitos ou fins em nossas existências. Considerando o pensamento do filósofo grego (384 a 322 a.C.), nossas existências se completariam através desses fins, que para efeito de compreensão, dividimos em subsidiários e últimos.

Os subsidiários seriam apontados à nossa escolha através de uma vida contemplativa, de gozo ou política. Como fim último, Aristóteles indica a felicidade (eudaimonia).

O telos, ou a finalidade de cada coisa conforme prevista no Cosmos, quando conectado a felicidade, entendendo esta como bem agir e viver conforme previamente estabelecido por leis que extrapolam conceitos físicos, não consiste nem nos prazeres, nem nas riquezas, nem nas honras, mas nas práticas virtuosas, ou seja, hábitos dignos de louvor, portanto, segundo Aristóteles, para a realização da finalidade última do ser humano, a felicidade, o homem deveria ser virtuoso[2].

Em termos explicativos ou narrativos, o conceito grego de felicidade, ora apresentado é muito mais complexo que a referência a um mero passeio no shopping, ou um bom final de semana de sol na praia, a felicidade pretendida não estaria resumida a boas e momentâneas sensações sexuais, ou a prazeres voláteis e passageiros, seria uma proposta a ser perseguida, como um estado de permanência e grande final à própria existência.

Quanto à virtude abro parênteses, conclui Aristóteles que o homem não seria virtuoso por natureza, essa qualidade não seria um dom presente em cada um, não seria o caso de ser ou não ser, mas de opção ao seu exercício e prática[3].

Assim, a virtude surge ao ser humano em razão de seu exercício constante, através do oferecimento das possibilidades de aplicação de regras justas no seu cotidiano, da aplicação da justiça nos seus atos[4].

Sem perder o fio condutor do pensamento aristotélico, a felicidade, que só se realizaria através de hábitos dignos de louvor, a virtude, seria alcançada via aplicação de regras justas nos atos diários, da justiça.

A propósito, quanto à justiça, Aristóteles afirmava que esta seria entre todas a “virtude primas”, isso porque quando exercitada não beneficiaria ao próprio praticante, mas sempre ao outro.

Os ideais de justiça aristotélicos poderiam ser resumidos como “dar a cada um o que é seu por natureza”, diferentemente de conceitos mais modernos como o de John Halls, que afirma a justiça como igualdade numa perspectiva universal.

A questão de receber o que lhe é de direito por ser ou não ser um direito natural, bem que poderia ser abordada nesse instante, como também a questão da igualdade universal, mas o propósito do texto é caminhar mais focado e sinteticamente na busca aristotélica da felicidade.

Voltando, a justiça desejável por Aristóteles residiria não só na distribuição das coisas aos seus pré-estabelecidos donos, mas deveria ser distribuída por meio de regras justas, ou seja, que não faltasse ou sobrasse[5], mas que atingisse a justa medida, ou mediania do que deveria ser entregue.

Assim, para atingir a justiça deveria se aplicar uma fórmula, que buscasse através de uma escolha ou deliberação das ações a posição mediana, que também, obedeceriam duas premissas maiores, quais sejam, considerar o alcance e possibilidades das medidas, bem como os meios para atingi-los.

Por alcance e possibilidade das medidas devemos entender como a escolha de coisas que estão dentro de um horizonte possível de ser realizado; por outro lado, nessa busca da mediania para se atingir a justiça, temos que considerar os meios adequados para a sua consecução. Infeliz é o homem que quer voar com o bater de seus braços.

Finalmente, o mestre grego na sua caminhada à felicidade aduz da necessidade de prudência nos hábitos, nas ações. A ação equilibrada que visualiza o bem, o propósito é a prudência, em última análise, o hábito da prudência é a possibilidade da meta optata, da possibilidade de consecução de seus projetos.

Para ser feliz deve-se perseguir o bem, o homem bom escolhe o bem, entretanto, conclui Aristóteles, quem não é bom escolhe o que lhe parece o bem[6]. Como saber quando estamos no caminho certo? Fácil, saberemos que não alcançamos o bem quando não nos sentimos felizes.


[1] Gilvan Luiz Hansen - Possui Graduação em Filosofia pela Universidade de Passo Fundo (1985), Mestrado em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (1997) e Doutorado em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2004). Atualmente é professor da Universidade Federal Fluminense, docente de Graduação, do Mestrado em Justiça Administrativa, do Mestrado e Doutorado em Sociologia e Direito. Exerce as funções de Subchefe do Departamento de Filosofia e de Coordenador do Curso de Graduação em Filosofia da UFF. Tem experiência e publicações na área de Filosofia, com ênfase em Ética, Filosofia do Direito, Filosofia da Educação e Filosofia Política. Pesquisador de temas atinentes ao Idealismo Alemão (Kant e Hegel), ao Marxismo, à Escola de Frankfurt e às discussões contemporâneas sobre Ética, Justiça, Cidadania, Direito e Democracia (Habermas, Rawls)

[2] “O homem feliz parece necessitar também dessa espécie de prosperidade; e por essa razão, alguns identificam a felicidade com a boa fortuna, embora outros a identifiquem com a virtude" - Ética à Nicômaco I, 8-1099 b

[3] “Como no homem que dorme ou que permanece inativo; mas a atividade virtuosa, não: essa deve necessariamente agir, e agir bem" - Idem, I, 8 – 1099 a

[4] “(…) os homens tornam-se arquitetos construindo e tocadores de lira tangendo seus instrumentos. Da mesma forma, tornamo-nos justos praticando atos justos" - Idem, II, 1 – 1103 b

[5] “Tanto a deficiência como o excesso de exercício destroem a força; e da mesma forma, o alimento e a bebida que ultrapassam determinados limites, tanto para mais como para menos, destroem a saúde" - Idem, EN II, 2 –1104 a

[6] “Mas a maioria dos homens não procede assim. Refugiam-se na teoria e pensam que estão sendo filósofos e se tornarão bons dessa maneira. Nisso se portam como enfermos que escutassem atentamente seus médicos, mas não fizessem nada do que estes lhe prescrevem" - Idem, II, 4 – 1105 b

21 setembro, 2010

Habeas corpus

Definida etimologicamente a expressão habeas corpus tem o significado de “que tenhas meu corpo”. Ao que pese ter sido cunhada em referência ao direito de “ir e vir”, modernamente ampliada pela doutrina jurídica indicando também o direito de “ficar e parar”, a abordagem ora pretendida refere-se ao domínio da vontade sobre o corpo, manifestada de maneira livre e consciente diante do processo eleitora em curso.

Passando pelas ruas podemos observar homens e mulheres que empunham bandeiras, galhardetes ou mesmo se tornam mero vigias de placas, tudo por força de uma questionável legislação eleitoral, que se por um lado não permite a fixação das sorridentes fotos candidatas pelos muros, por outro autoriza a divulgação, desde que controladas e ostentadas pelas mãos humanas, aceitando, portanto, "voluntariosos" atos de ostentação ideológica ou programática.

Bem demonstrando como futuramente interpretarão as normas que estarão submetidos ou ajudarão a elaborar, em processo de esplendorosa criatividade, nossos candidatos a parlamentares ou administradores públicos, não de hoje, encontraram um “atalho” no Código Eleitoral para burlar a lei, pagando às massas de desempregados valores, que ao nosso conhecimento, vão de quatrocentos a um mil e duzentos reais mensais, para serem os fieis guardiões de seus letreiros, em notável degradação final da sua condição de “ser livre” e racional eleitor.

Um tanto estranha a legislação, um quanto hipócrita sua interpretação. Na previsão do art. 299 do Código Eleitoral[1], comprar voto é crime, mas a lei silencia em razão da compra da livre manifestações de apreço e engajamento às candidaturas, silência quanto ao uso do ser humano como coisa, como res nullius (coisa de ninguém), sem valor senão o de uso, disponível como poste de rua.

Quem duvida que os batalhões de desdentados e de famintos que ora vagueiam pelas ruas como cartazes e bandeiras, ambulantes sem destino ou com destino traçados como coisa natural, sejam na verdade a representação do autêntico abuso do poder econômico, também previsto, mas não reprimido por uma cega interpretação da legislação eleitoral (art 237 do Código Eleitoral[2])?

Que cada um tenha seu corpo, como creio que tenho o meu; que cada um use livremente seu corpo, como uso o meu; que cada corpo seja a expressão de idéias livres, como expresso com o meu; que a fome e a necessidade não sejam os grilhões modernos para o controle dos corpos e mentes; e que a democracia seja condição de possibilidade da sociedade, não mera formalização ou condição de exercício de poder.



[1] Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita:

Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa.

[2] Art. 237. A interferência do poder econômico e o desvio ou abuso do poder de autoridade, em desfavor da liberdade do voto, serão coibidos e punidos.