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"Por favor, leia devagar." (Ferreira Gullar)

22 setembro, 2010

Aristóteles e a felicidade

Meu amigo Gilvan[1] ensina que conforme conceitos aristotélicos teríamos alguns propósitos ou fins em nossas existências. Considerando o pensamento do filósofo grego (384 a 322 a.C.), nossas existências se completariam através desses fins, que para efeito de compreensão, dividimos em subsidiários e últimos.

Os subsidiários seriam apontados à nossa escolha através de uma vida contemplativa, de gozo ou política. Como fim último, Aristóteles indica a felicidade (eudaimonia).

O telos, ou a finalidade de cada coisa conforme prevista no Cosmos, quando conectado a felicidade, entendendo esta como bem agir e viver conforme previamente estabelecido por leis que extrapolam conceitos físicos, não consiste nem nos prazeres, nem nas riquezas, nem nas honras, mas nas práticas virtuosas, ou seja, hábitos dignos de louvor, portanto, segundo Aristóteles, para a realização da finalidade última do ser humano, a felicidade, o homem deveria ser virtuoso[2].

Em termos explicativos ou narrativos, o conceito grego de felicidade, ora apresentado é muito mais complexo que a referência a um mero passeio no shopping, ou um bom final de semana de sol na praia, a felicidade pretendida não estaria resumida a boas e momentâneas sensações sexuais, ou a prazeres voláteis e passageiros, seria uma proposta a ser perseguida, como um estado de permanência e grande final à própria existência.

Quanto à virtude abro parênteses, conclui Aristóteles que o homem não seria virtuoso por natureza, essa qualidade não seria um dom presente em cada um, não seria o caso de ser ou não ser, mas de opção ao seu exercício e prática[3].

Assim, a virtude surge ao ser humano em razão de seu exercício constante, através do oferecimento das possibilidades de aplicação de regras justas no seu cotidiano, da aplicação da justiça nos seus atos[4].

Sem perder o fio condutor do pensamento aristotélico, a felicidade, que só se realizaria através de hábitos dignos de louvor, a virtude, seria alcançada via aplicação de regras justas nos atos diários, da justiça.

A propósito, quanto à justiça, Aristóteles afirmava que esta seria entre todas a “virtude primas”, isso porque quando exercitada não beneficiaria ao próprio praticante, mas sempre ao outro.

Os ideais de justiça aristotélicos poderiam ser resumidos como “dar a cada um o que é seu por natureza”, diferentemente de conceitos mais modernos como o de John Halls, que afirma a justiça como igualdade numa perspectiva universal.

A questão de receber o que lhe é de direito por ser ou não ser um direito natural, bem que poderia ser abordada nesse instante, como também a questão da igualdade universal, mas o propósito do texto é caminhar mais focado e sinteticamente na busca aristotélica da felicidade.

Voltando, a justiça desejável por Aristóteles residiria não só na distribuição das coisas aos seus pré-estabelecidos donos, mas deveria ser distribuída por meio de regras justas, ou seja, que não faltasse ou sobrasse[5], mas que atingisse a justa medida, ou mediania do que deveria ser entregue.

Assim, para atingir a justiça deveria se aplicar uma fórmula, que buscasse através de uma escolha ou deliberação das ações a posição mediana, que também, obedeceriam duas premissas maiores, quais sejam, considerar o alcance e possibilidades das medidas, bem como os meios para atingi-los.

Por alcance e possibilidade das medidas devemos entender como a escolha de coisas que estão dentro de um horizonte possível de ser realizado; por outro lado, nessa busca da mediania para se atingir a justiça, temos que considerar os meios adequados para a sua consecução. Infeliz é o homem que quer voar com o bater de seus braços.

Finalmente, o mestre grego na sua caminhada à felicidade aduz da necessidade de prudência nos hábitos, nas ações. A ação equilibrada que visualiza o bem, o propósito é a prudência, em última análise, o hábito da prudência é a possibilidade da meta optata, da possibilidade de consecução de seus projetos.

Para ser feliz deve-se perseguir o bem, o homem bom escolhe o bem, entretanto, conclui Aristóteles, quem não é bom escolhe o que lhe parece o bem[6]. Como saber quando estamos no caminho certo? Fácil, saberemos que não alcançamos o bem quando não nos sentimos felizes.


[1] Gilvan Luiz Hansen - Possui Graduação em Filosofia pela Universidade de Passo Fundo (1985), Mestrado em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (1997) e Doutorado em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2004). Atualmente é professor da Universidade Federal Fluminense, docente de Graduação, do Mestrado em Justiça Administrativa, do Mestrado e Doutorado em Sociologia e Direito. Exerce as funções de Subchefe do Departamento de Filosofia e de Coordenador do Curso de Graduação em Filosofia da UFF. Tem experiência e publicações na área de Filosofia, com ênfase em Ética, Filosofia do Direito, Filosofia da Educação e Filosofia Política. Pesquisador de temas atinentes ao Idealismo Alemão (Kant e Hegel), ao Marxismo, à Escola de Frankfurt e às discussões contemporâneas sobre Ética, Justiça, Cidadania, Direito e Democracia (Habermas, Rawls)

[2] “O homem feliz parece necessitar também dessa espécie de prosperidade; e por essa razão, alguns identificam a felicidade com a boa fortuna, embora outros a identifiquem com a virtude" - Ética à Nicômaco I, 8-1099 b

[3] “Como no homem que dorme ou que permanece inativo; mas a atividade virtuosa, não: essa deve necessariamente agir, e agir bem" - Idem, I, 8 – 1099 a

[4] “(…) os homens tornam-se arquitetos construindo e tocadores de lira tangendo seus instrumentos. Da mesma forma, tornamo-nos justos praticando atos justos" - Idem, II, 1 – 1103 b

[5] “Tanto a deficiência como o excesso de exercício destroem a força; e da mesma forma, o alimento e a bebida que ultrapassam determinados limites, tanto para mais como para menos, destroem a saúde" - Idem, EN II, 2 –1104 a

[6] “Mas a maioria dos homens não procede assim. Refugiam-se na teoria e pensam que estão sendo filósofos e se tornarão bons dessa maneira. Nisso se portam como enfermos que escutassem atentamente seus médicos, mas não fizessem nada do que estes lhe prescrevem" - Idem, II, 4 – 1105 b

Um comentário:

Unknown disse...

Ozéas que saudades, joguei atolaha mesmo, só fico no facebook, é mais curtinho ,ta todo mundo lá:
http://www.facebook.com/?ref=home#!/Starsassa
Apareça por lá.

Infelizmente nossos governantes nunca leram Aristóteles, alias parecem que nunca leram nada além do resultado do jogo do bicho.

Por mais que nos roubem, jamais encontrarão a felicidade, o prazer a satisfação e a paz, essa é a minha vingança.