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"Por favor, leia devagar." (Ferreira Gullar)

14 setembro, 2008

Permanência incondicional

O controle migratório talvez seja um dos pontos mais importantes da estratégia de colonização e ocupação do território e postos de trabalho de um país. É através do controle de entrada e permanência dos estrangeiros que se estabelece uma política migratória que vise atender as necessidades de ocupação, investimento, exploração do mercado de trabalho, parcerias comerciais e de educação, relações entre Estados, difusão religiosa, ou mesmo, para simples visita de turistas que pretendam deixar recursos.

Nesse espírito, a Lei 6.815/80 (Estatuto dos Estrangeiros), pauta no seu art. 4º, que poderá ser concedido pelo órgão de relações internacionais, vistos de I - de trânsito; II - de turista; III - temporário; IV - permanente; V - de cortesia; VI - oficial; e VII - diplomático.

Excluídos dos comentários desse texto, por não serem os objetivos pretendidos, os itens I, II, VI e VII, destaco os itens III, IV e V.

Visitar o Brasil é bom para quem vem, porque encontra um dos lugares mais lindos e ricos em belezas naturais, como também, pode participar de uma gama de opções em lazer pouco superada no mundo; visitar o Brasil também é bom para o país, porque representa entrada de divisas, geração de empregos diretos e indiretos, além de proporcionar melhores instalações e produtos, que ficam permanentemente disponibilizados aos próprios brasileiros.

Entretanto, mesmo com todos os atrativos indicados, o Brasil recebe somente algo em torno de 6 milhões de turistas/ano, ao contrário da Espanha, principal portal de entrada turística do planeta, que recebe mais de 60 milhões de visitantes por ano, mesmo assim, o turismo ainda é excelente para economia e cartão postal de visibilidade, atraindo outros investimentos internacionais. Bem vindo, portanto, o portador do visto de Turista, expedido ou dispensado pelo Ministério das Relações Internacionais.

Ocorre que, uma vez no Brasil, se o Turista resolve constituir família, casando-se com brasileiro(a), ou mesmo mantendo relação familiar estável (sociedade conjugal), ou tem um filho brasileiro, requerendo, passa a desfrutar do privilégio legal de modificar sua condição de Turista (item II) para Permanente (item IV), ou seja, se torna inexpulsável enquanto sua condição persistir.
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A propósito, o visto de turista tem prazo máximo de 90 dias prorrogável por igual período em um ano, a partir da entrada do estrangeiro em solo nacional, uma vez demonstrada sua capacidade de sustento (cartões de crédito, dinheiro em espécie, cheque de viagem...) e, passagem de volta comprada.

Outra condição, ora em comento, diz respeito ao alienígena Temporário, que conforme previsto no art.13 do mesmo Estatuto dos Estrangeiros recebem a classificação de: I - em viagem cultural ou em missão de estudos; II - em viagem de negócios;
III - na condição de artista ou desportista; IV - na condição de estudante; V - na condição de cientista, professor, técnico ou profissional de outra categoria, sob regime de contrato ou a serviço do Governo brasileiro; VI - na condição de correspondente de jornal, revista, rádio, televisão ou agência noticiosa estrangeira; e VII - na condição de ministro de confissão religiosa ou membro de instituto de vida consagrada e de congregação ou ordem religiosa.

O estrangeiro que pretenda ingressar em solo pátrio na condição de Temporário, deverá antes de sua chegada ao Brasil, procurar um órgão diplomático e requerer o visto, que será objeto de análise, exigências (contrato de trabalho, convênio etc.) e, ficará sujeito ao critério de conveniência e oportunidade, julgado conforme os interesses brasileiros. Esse visto é concedido por prazo certo e para a determinada condição. Terminado um ou outro, o estrangeiro deverá retirar-se do país, salvo se tiver constituído família ou tenha um filho brasileiro, quando então poderá continuar no Brasil na condição de Permanente, conforme já informado.

Pois bem, esse é o quadro geral, que a princípio atende aos interesses do país e ao mesmo tempo, estabelece as regras de quem queira por aqui estar, definindo por um lado os interesses nacionais e por outro atendendo a vontade regrada de quem pretenda a estada.

Acontece que, em virtude de ajustes firmados no Cone Sul, leia-se interesses do MERCOSUL, foram celebrados acordos com a Argentina, Uruguai e a Bolívia, que permitem que os nacionais desses países entrem em território brasileiro e em reciprocidade, os brasileiros por lá também encontrem as mesmas facilidades.

Argentinos, uruguaios e bolivianos, uma vez em solo brasileiro, que ingressaram na condição de Turistas, sem inicial exigência de visto, podendo inclusive fazer a travessia de fronteira com a exibição de documento de identidade civil, portanto, abolida a exigência de passaporte, através de simples pedido de registro junto ao Departamento de Polícia Federal, podem pleitear a condição de Temporários, pelo prazo fixo de dois anos, ainda que estejam desempregados, desabrigados, jogados pelas praças fabricando pulseiras e colares de miçangas para serem vendidos no comércio informal.

Após o interstício probatório de residência dos dois anos, esse imigrante especial, independente de sua situação de estada, poderá requerer a transformação de sua condição de Temporário para Permanente definitivo, recebendo no final do processo Cédula de Identidade de Estrangeiro, renovável somente em dez anos.

Antes que seja feita a clássica crítica de preconceito ou xenofobismo, esclareço, não sou contra os movimentos migratórios ou guardo reservas absolutas quanto à entrada de irmãos do mundo no Brasil para buscar oportunidades. Nossa história foi construída por verdadeiros brasileiros nascidos em outras terras, que vieram desbravar, conquistar e desenvolver o país, construindo essa nação plural e das mais democráticas em termos de construção de sua identidade, apenas acredito que as regras não possam ser tão absolutas e liberais como as que estão sendo aplicadas, conforme os acordos firmados.

Os países signatários que se beneficiam dos acordos indicados, transmitem muitas vezes suas responsabilidades sociais para o Brasil. Nessa relação desigual de condições, o Brasil não está se tornando um novo El Dorado para oportunidades ou crescimentos, mais lugar de refúgio para desabrigados e desempregados internacionais, como se não bastassem os nossos desamparados e combalidos, que por mais de um século fogem de regiões de abandono buscando oportunidades nos grandes centros, não sendo raro os momentos que terminam sob os viadutos ou instalados em casebres nas favelas periféricas.

O Brasil que não consegue resolver sua miséria 100% nacional, agora é importador da tragédia alheia, que acolhe e legaliza com um custo social ainda inestimável. O país está se tornando solo de última esperança, daqueles que resolvem abandonar suas origens na busca de subempregos ou simplesmente do que comer, competindo em iguais condições de despreparo, com nossos famintos e marginalizados, alimentados através de programas assistencialistas de nítido contorno populista e eleitoreiro.

Pela história, sempre que um país resolve abrir suas fronteiras à mão-de-obra imigrante, assim o faz para adquirir tecnologia de época, capital de investimento ou colonização de grandes áreas carentes de presença humana, não é o caso no momento nacional, até porque, quase a integralidade desses novos residentes Permanentes, não trazem nada além de suas carências pessoais, baixa tecnologia, inferior conhecimento científico e não se instalam nas áreas interiores do país, firmando domicílio nos grandes centros urbanos, disputando moradias e empregos de nível intermediário para inferior.

Quando por sorte, alguns dos novos Permanentes trazem alguma forma mais concreta de investimento, o fazem de maneira desinteressante para o Brasil. Exemplo transparente dessa imigração e exploração de ocasião se dá no município de Búzios/RJ, que reputo ser a segunda capital da República Argentina, onde alguns poucos investidores portenhos, já dominam a rede de pousadas e hotéis da cidade, entretanto, remetem periodicamente seus ganhos para seu país de origem, numa gangorra que oscila conforme a relação cambial, pouco se importando em construir raízes ou desenvolver o local, como faziam nossos antepassados português, espanhóis, italianos, japoneses etc..

Ainda em Búzios, a mão-de-obra nativa sofre o preconceito e é apartada de qualquer oportunidade, quando em disputa direta com outros “hermanos” menos aquinhoados e também Permanentes no município, não sobram aos buzianos os empregos mais simples, como guardadores de carros, faxineiros, garçons, arrumadeiras etc..

O fato é que ainda não foi dimensionado o custo social dessa política de relações sem contrapartida, ainda não se mediu as conseqüências que já se evidenciam para os próximos anos, outros exemplos e situações podem ser apontados em mesmo compasso.

O sonho de unificação das Américas parece ter um custo elevado e já estamos pagando o preço, bastante caro e sem as devidas explicações. Acredito e defendo a necessidade do preenchimento de requisitos mínimos para a Permanência no Brasil dos nossos vizinhos sul-americanos, afinal somos tão rigorosos com simples turistas que pretende ficar para gastar e gerar empregos, mas não usamos da mesma medida nessa recepção descontrolada.

Um comentário:

Ricardo Rayol disse...

Como toda política dita "social" não há o menor planejamento. Aqui ainda não percebi esse tipo de coisa