Minhas opiniões e publicações, expostas neste espaço, são reflexões acadêmicas de um cidadão-eleitor, publicadas ao abrigo do direito constitucional da liberdade de expressão

"Por favor, leia devagar." (Ferreira Gullar)

12 agosto, 2015

Mudança de rumos



Conforme a pauta do Supremo Tribunal Federal, nesta quinta-feira – 13/08 –, através do Recurso Extraordinário nº 635.659, será discutida a constitucionalidade do art. 28 da Lei 11.343/06, trocando em miúdos, o que está em jogo neste julgamento é a descriminalização do porte de drogas para uso pessoal. 

A tese defensista expõe que o comando da Lei de Drogas viola o princípio constitucional da “intimidade e vida privada” – art. 5º, X da CF/88 –, ou seja, espera a defesa que os Ministros do STF testifiquem que determinada conduta só pode ser considerada criminosa quando lesiona bens jurídicos alheios, portanto, como no porte para uso pessoal a ação permanece tão somente na esfera do autor, não há que se falar em alteridade e lesividade.

A propósito do tema, algumas considerações há muito me convenceram que o caminho que estamos percorrendo para enfrentar o problema das drogas não poderia ser pior. A “guerra às drogas”, assim nominado o combate sistemático ao comércio e uso de substâncias entorpecentes não autorizadas por lei, tem juntado vultosas derrotas à sociedade, num triste enredo de desperdícios de vidas, dinheiro e dependências.

De expressiva significância também é a aplicação de uma política criminal pautada por paradigmas bélicos, traduzida pela expressão “guerra às drogas”, que de per si, demonstra um processo de eleição interna de inimigos; sem outra interpretação possível, se há uma guerra deflagrada é porque existem polos antagônicos inconciliáveis por outras vias, portanto, o embate só se resolve através da destruição do outro. Em suma, vivemos uma guerra civil não declarada, que tem como pano de fundo justificativas políticas-jurídicas-penais seletivas.  

Expandindo a compreensão do problema colacionamos alguns números:  entre os anos de 2009 e 2013 essa “batalha” matou mais de 230 mil pessoas no planeta, dimensionando o confronto, comparativamente, entre os anos de 2003 e 2011, na guerra de ocupação do Iraque pelos EUA, morreram 62 mil pessoas, considerando todos os envolvidos no conflito – civis e militares.

Quanto a gastos, no ano de 2013 o Brasil consignou à segurança pública R$ 61,1 bilhões, como é manifesto que o estado brasileiro faz a eleição de seu inimigo na figura do combate às drogas ilícitas, pode-se imaginar quanto da polpuda quantia não foi lançada nessa direção.

Em parâmetro global, estima o Fundo Monetário Internacional - FMI, que a lavagem de dinheiro movimenta anualmente um valor entre US$ 800 bilhões a US$ 2 trilhões de dólares, o que representa de 3%  à  5% do Produto Interno Bruto mundial, sendo que desta quantia,  80% são provenientes do tráfico de drogas. Refletidos esses valores como potencial para manutenção e desenvolvimento do “negócio” ilícito é quase impossível imaginar o quanto, proporcionalmente, deveria ser exigido para combatê-lo em patamares semelhantes através do enfrentamento militar.

Destarte a importância deste julgamento pelo STF, que pode ter o condão de enfraquecer a tese beligerante ora dominante no país, afinal, no mesmo momento que o mundo se curva diante da facticidade imperiosa de estar lutando numa guerra perdida, assumindo legítimas formas de combate ao vício através da legalização, controle, profilaxia e cuidados, no Brasil a militarização do problema continua sendo a principal forma de enfrentar essa mazela.

Enfim, oxalá esteja a Corte Constitucional inspirada nesta quinta-feira para enfrentar o tema, longe de preconceitos, razões privadas e morais oblíquas, que insistem em afastar o tema do debate legislativo nacional, fazendo que em ativismo o Poder Judiciário acabe por deslindar matéria que deveria ser da conta e decisão de toda sociedade.

Nenhum comentário: