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"Por favor, leia devagar." (Ferreira Gullar)

09 junho, 2015

Arquimedes e a maioridade penal (título original)

Reproduzindo a matéria publicada no O Fluminense de 05.06.15  


No meu tempo de ginásio, era assim que se chamava parte do ensino fundamental, estudávamos em geografia que enquanto a população aumentava geometricamente, a oferta de alimentos crescia aritmeticamente, era a chamada Teoria de Malthus (1798), por esse postulado, em certo momento no planeta a fome seria inevitável, em razão da alta taxa demográfica não correspondida em semelhante proporção pela oferta alimentar.
Mais velho, fazendo obras em minha casa descobri a importância do “ladrão” da caixa d’água, afirmando o princípio de Arquimedes (século III a.C.), que “dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço”, desta forma, para que a caixa não transborde é necessário que exista vazão equivalente a entrada de água, sob pena de transbordamento e inundação.
       Pois bem, nem Malthus ou Arquimedes supunham que suas teorias serviriam para observação do fenômeno do encarceramento massivo, ainda mais num Brasil do século XXI, todavia, olhando bem de perto, o que temos é aplicação prática de seus conceitos pela doutrina neoliberal justificando a redução da maioridade, ou seja: diante do crescimento e ocupação (712 mil) e do déficit de vagas no sistema prisional (374 mil) e, da ineficiência do Estado em construir com rapidez suas cadeias e administrar com eficiência seus presos, o que parece estar em jogo é a intenção velada da privatização total dos presídios, servindo para isso como um dos panos de fundo o discurso modificador da idade de imputação.
       A redução da maioridade, o aumentos das penas, a criação de novos tipos incriminadores (“olha a faca!”), a infeliz insistência na política fracassada de “guerra as drogas” etc., são detalhe macabros de um negócio que cresce na base da demanda de sua clientela, afinal, para que um presídio seja mais e mais rentável é indicado que a população carcerária se expanda como em qualquer negócio, neste ponto, o componente de redução da maioridade penal serve sobremaneira para o aumento dos lucros dos construtores e administradores dos presídios.
       Se a demanda é inflada, ainda que artificialmente através da onda terrorista infanto-juvenil, consequentemente, dois presos não poderão ocupar o mesmo lugar no cárcere, portanto, aumentar o número de vagas e sua administração é tarefa adequada para empreiteiras e empresários de segurança.
       Sem ilusões ou ingenuidades, bem sabemos que agravamentos de sanções, tipos penais mais restritivos ou políticas conservadoras nunca reduziram índices criminais, veja-se por exemplo a Lei dos Crimes Hediondos, do Crime Organizado e tantas outra, é difícil imaginar que o malfeitor pare para pensar na hora “H”: “inafiançável, rito ordinário, regime fechado… tô fora!”
       Enfim, quando tempo e espaço são curtos valem mais as observações, para outras reflexões: a quem servirá de verdade a redução da maioridade penal, alguém acredita mesmo que esta tem o condão de solucionar o todo complexo que é a falência do sistema penal brasileiro?

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