Ninguém abre mão de seu corpo, liberdade e opinião; mas todos querem a proteção e certeza que “além do horizonte deve ter, algum lugar bonito e tranqüilo, pra viver em paz”.
Ninguém quer ser tolhido, vigiado e regulado por uma ordem superior; mas todos querem a segurança e o colo provedor, nas horas de aflição.
Ninguém gosta de um pai durão, repressor, autoritário e acusador, de dedo em riste na mão; mas todos querem a certeza de voltar pra casa a noite e não ter que se preocupar com “o que será do amanhã”.
E por ai vai..., são as contradições existenciais que a modernidade nos trouxe. Por um lado a certeza que podemos construir nossos destinos, que temos “o mundo em nossas mãos”; porém, logo descobrimos que há um preço a pagar por nos tornarmos senhores de nossos destinos.
O ser, moderno e racional é construtor de seus próprios caminhos, todavia, também sujeito aos riscos que essa autonomia lhe dá; na sua emancipadora modernidade, não tem mais como se socorrer da providência divina, na hora que a coisa não anda lá como esperada; como diz um amigo, “a banca paga, mas a banca cobra”.
A modernidade, inventada pela razão, abandonou os mistério do mundo e suas superstições; entretanto, ao se descolar dos dogmas e tradições infundadas, jogou fora junto com toda água suja, as esperanças de que “amanhã vai ser outro dia”.
É uma tremenda frustração viver na era moderna, ainda mais quando se está em pleno período de transição, quando ainda não bem se sabe, ser “barro ou tijolo”.
Não somos “os últimos dos tempos”, somos os primeiros de uma era, cercada de insegurança por todos os lados; de riscos por todos os cantos; de encantos que desencantam num clique de mouse; “navegadores dos sete mares”, que ainda não sabem sequer, quantos mares existem para ser descobertos e cartografados.
Nosso tempo, pela primeira vez na existência humana, é contado de trás para diante, temos pressa de viver, porque descobrimos que nascemos contando a chegada de nosso fim; precisamos realizar tudo em minutos e segundos, não há tempo para esperar, a banda tem que ser “larga”, a imagem em “high definition”, o som tem que ser “polifônico”, os contatos tem que ser globalizados, enfim, nossa modernidade exige tudo ao mesmo tempo e na sua maior intensidade, ainda que por vezes isso se torne tarefa impossível.
Não realizar tornou-se sinônimo de fracasso; não conquistar, de derrota; não avançar, de retrocesso; perdemos a noção simplória do aprendizado com nossos erros, não há mais tempo a perder com o aprender. Se antes, “o que não nos matava nos fortalecia”, agora o que nos causa é uma sensação de impotência e incapacidade.
Diante das angustias, ainda ajoelhamos olhando para o Universo, pedido socorro aos deuses que matamos com nossas razões, porém, que não queremos mais de volta, afinal, pela primeira vez somos senhores de nossos corpos, “corações e mentes”. Somos nossos deuses, mas também nossas desilusões; verdadeiros reis, “João Sem Terra”, num latifúndio que sequer conhecemos o tamanho.
As frustrações e desencantos são “as conseqüências da modernidade”, afinal, se não há mais o dedo moral apontado e nossa direção, também, perdemos o colo protetor da segurança ao retornarmos para casa.
A modernidade nos fez órfãos e abandonados, “sem parente importante e vindo do interior”, sem sobrenome de família e despossuídos de qualquer bem; assim, temos que viver e sobreviver todos os dias, da melhor e possível forma, nessa cidade grande que se apelidamos de mundo, carregando nossa bagagem de mão repleta de interrogações, caminhando na direção da construção de nossas identidades, porém, sem perder a perspectiva de “Viver! E não ter a vergonha de ser feliz. Cantar e cantar e cantar. A beleza de ser um eterno aprendiz”