O delegado Milton Olivier, titular da 81ª Delegacia de Polícia, responsável pela circunscrição da Região Oceânica de Niterói, resolveu inovar diante da lei penal, está cadastrando os guardadores de carros nas ruas de sua fiscalização policial (fonte, O Fluminense)
Os populares de “flanelinhas”, não raras vezes asquerosos praticantes do crime de extorsão, contam agora com a anuência e censo daquele que deveria coibir suas práticas ilegais, não só sob o ponto de vista administrativo, como também violando a própria legislação penal. O crime existe, está tipificado no artigo 158 do Código Penal.
Os populares de “flanelinhas”, não raras vezes asquerosos praticantes do crime de extorsão, contam agora com a anuência e censo daquele que deveria coibir suas práticas ilegais, não só sob o ponto de vista administrativo, como também violando a própria legislação penal. O crime existe, está tipificado no artigo 158 do Código Penal.
Art. 158 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar fazer alguma coisa.
A crise é grave, não é de hoje, sempre foi e dificilmente será diferente para todos nós, não me iludo com a possibilidade do toque de condão, transformador imediato numa sociedade mais justa e fraterna, portanto, acredito no trabalho sério e honesto, onde se eu tiver algum produto ou serviço para vender, será feito de forma que não leve alguém a estar subsumido a minha vontade, pela ameaça ou constrangimento.
Quando pouco nos resta senão o lazer como forma compensatória do stress diário, devemos ter a liberdade de ir e vir, ficar e parar, sem estarmos tutelados, ou por uma permissão de exploração de espaços públicos, oficial e obtida por licitação, ou por marginais disfarçados de “guardadores de carros”, que ameaçam nossa integridade se não nos submetermos ao seu loteamento, tudo sob as vistas tolerantes do Poder Público.
A justificativa do doutor delegado da 81ª DP é falaciosa e criminosa. O ponto principal de sua justificativa reside no propósito da diminuição dos índices de crimes de roubos e furtos de automóveis, diz a autoridade policial: “Os números são claros. Depois desse trabalho, a tendência é diminuir as ocorrências em toda a região. É uma certa garantia que estamos dando para a população que precisa e tem o direito de estacionar o carro”.
Se a autoridade conhece, ao ponto de cadastra os infratores, “o cadastro contém foto, endereço, número de identidade e telefone dos flanelinhas”, de certo deveria coibi-los de agir livre e impunemente.
Não há dúvidas que a recusa ao aceite de pagamento de 1, 2, 3, 5, 10 reais, possa causar represálias do tipo, veículos arranhados, pneus furados ou mesmo furtos de aparelhos de som ou outros objetos que estejam em seu interior, por isso pagamos, ninguém paga o “resgate antecipado” para gerar trabalhos ou porque se sente mais seguro com a presença de um “flanelinha”, pagamos porque somos constrangidos mediante a grave ameaça ou mesmo da própria violência que pode ocasionar nossa recusa, ainda que silenciosa ou implícita já na abordagem.
Se o delegado Milton Olivier quer reduzir os índices da violência em seu terreiro, não deve camuflá-los ou barganhar de um delito para outro, crime é crime e ponto. A lei não faculta aos policiais a ponderação de valores, ou aplicação de uma teoria da proporcionalidade delituosa, muito menos da razoabilidade diante do mal maior. A propósito, cabe ao delegado Olivier cumprir outra lei que parece esquecida com sua atitude, o Código de Processo Penal, especificamente seu art. 301.
Art. 301. Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.
Não é uma faculdade a prisão e a coerção ao crime, a tolerância não pode ser admitida como política criminal de enxugamento de números desagradáveis à administração de uma delegacia. Somente quando a lei expressamente autoriza o retardamento da ação policial (crimes praticados por organizações criminosas, tráfico de entorpecentes etc.), assim mesmo, devidamente monitorado pelo Ministério Público e pelo Poder Judiciário, poderá a autoridade policial não agir, sob pena de star praticando no minus, transgressão administrativa disciplinar e dependendo da situação, até mesmo o crime de prevaricação, conforme a redação do Código Penal no seu art. 319.
Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal.
Por fim, a tolerância indiscriminada e o aceite aos comportamentos considerados de menor potencialidade ofensiva, fora dos casos previstos em lei, levaram o Estado do Rio de Janeiro e mesmo o Brasil a nossa atual condição de reféns do medo. O tráfico organizado e as milícias não surgiram da noite para o dia, nem por força de decreto divino, ambos são resultados de uma política tolerante, quando não se combateu o crime, quando ainda era somente um perigo inferior ou imaginário.